terça-feira, 22 de novembro de 2011

A insurreição das vassouras! Ou Uma homenagem a todas as Cíceras e Terceirizadas lutadoras.

A insurreição das vassouras!
A luta é dura, companheiro”. É com esta constatação que uma trabalhadora anuncia ao estudante mais um dia no piquete das trabalhadoras e trabalhadores terceirizados da Empresa União, bloqueando mais uma vez a entrada da surda e muda- porém, implacável- Reitoria.
Por debaixo de suas pernas cansadas, o velho papelão que, neste dia, garante que se sente sem sujar
suas roupas. Ele é o mesmo sob o qual todos os dias coloca sua comida e descansa seus cravados 20 minutinhos de almoço, fora, obviamente, dos prédios nos quais trabalha dentro da USP. Não é que ela goste ou tenha qualquer sentimento bucólico de ficar no mato, mas é que é preciso algo que a proteja do chão sujo no qual é obrigada a comer, uma vez que sua permanência junto a estudantes e professores é proibida.

Por cima, os raios escaldantes de sol atingem sua pele e aquecem todo o corpo. Curiosamente, ela pensa o quanto é melhor estar neste sol, do que ter de limpar com aquele uniforme calorento cerca de 33 salas em menos de 2 horas, repetindo esta maratona de hora em hora e, depois, no fim do dia, voltar para casa sem um banho. O que lhe resta de humor a faz pensar o quão parecida com uma atleta ela seria.

São muitos dias sem seu salário ou qualquer forma de subsistir. Lembra destes dias.. no quarto a criança chora e o irmão mais velho- que não passa dos 6 anos- inocentemente pede por um danone ou algo que adocique a vida no barraco abafado. O “dono do domicílio” já disse que, se não pagar os 100 reais, ele vai ter de dar um jeito na situação. São 4:00 e a greve começa cedinho cedinho. É preciso sair. É preciso deixar seu filho na escola municipal e seu bebê com a vizinha do lado esquerdo. Hoje não vai ter nada pra almoçar, porquê o que sobrou no armário vai pra merenda do mais velho. Lembra de espremer um pouco mais da pomada para varizes que pegou mês passado no posto e passa na perna. Ajeita seu cabelo com o pente olhando pelo espelinho do banheiro, toma um copo de água e sai sem saber o que vai acontecer, se seu salário vai sair, se seu barraco vai ficar ou se é capaz de aguentar...

É – pensa divagante enquanto o estudante sorridente segue seu caminho - a luta é dura....

No meio desta angústia muitas coisas vem à sua cabeça. Lembra que está sem seu salário e o dono do barraco já deu seu ultimato; sua barriga a lembra que há 4 dias tem vivido de pão e suco. Sua mão inchada a lembra do conflito que teve com o burocrata sindical que não quis deixar ela e os meninos do sindicato da USP entrarem para falar com o reitor. Lembra da estudante, agressiva e violenta, a chamando de vagabunda, suja, e apontando para o lixo no chão como se um monstro estivesse ameaçando a vida desta estudante e ela tivesse sido a responsável pela liberação deste câncer...
Se sentia muito mal por tudo isto. Sentia que nada adiantava mais...

Curiosamente, no entanto, algo no rosto daquele estudante e no que ele disse conseguiu mudar aquilo que sentia. Não se sentia mais só. Ele havia dito“ É sim, companheira, é mesmo. Mas você não tá sozinha! De hoje eles não passam!” e virou-se com um sorriso confiante pra fazer sei lá o quê.

O que ele disse deu algum tipo de força a ela. Nunca um rapaz, branco, estudante, bem vestido, havia sequer se dirigido a ela. Agora ele estava ali suando, brigando, cantando, conversando dividindo a luta e brincando com ela. Sentia que não estava sozinha. Sentia que aquilo que ele dizia era sincero.

Um dia antes tinha ouvido umas coisas ditas por este e outros estudantes com jornais na mão dizendo como a TV e os jornais estavam falando: “ Vocês hoje, guerreiras e guerreiros, mostraram pra todos os patrões que o que fazem é fundamental. Se vocês continuarem parados, a USP vai parar e nós, os estudantes, estamos com vocês. Não vamos permitir a escravidão nem aqui nem em lugar nenhum. Vocês perceberam sua força e perceberam que unidos podem mudar as suas e as vidas de outras pessoas. A luta de vocês é histórica e um exemplo para todos os trabalhadores. Nós queremos estar ao seu lado ajudando com o que quiserem decidir.”

Estas palavras a fizeram pensar mais ainda, sobretudo, na tal escravidão. Não parecia certo, agora, o que faziam com ela no trabalho. Não parecia certo receber 500 reais e ter de andar 2 horas para chegar ao trabalho, pois não recebia vale transporte. Não parecia certo ouvir do chefe para calar a boca e ir trabalhar porquê já tinha 20 minutos de descanso e, pra ele, 5 minutos parados são 2 portas que ficam sujas. Não parecia certo ter de comer em banheiros, ou salas minúsculas ou ter de se deitar nos gramados fora dos prédios como indesejáveis.
Acima de tudo, não parecia certo aquele tipo de olhar, meio de lado, desconfiado, como que acusando-a de estar ali para roubar algo e, sendo assim, como se falasse para ela se rastejar e abaixar a cabeça pois ali não era um lugar para gente como ela.

O que os estudantes disseram fizeram ela pensar que aquilo não estava certo e AH, que alívio! Foram mais de 14 anos de silêncio e, durante todo este tempo, não sabia que podia sentir o que sente, pensar o que pensa e, agora, lutar como luta! “Não estou sozinha!Todas minhas companheiras agora tem gente que dá apoio!” Ela pensava...

Parou de pensar- ainda com o sorriso esperançoso no rosto- e levantou-se para ir a uma atividade que os alunos estavam chamando junto dos trabalhadores para discutir alguma coisa.

Lá, ouviu várias falas de companheiros trabalhadores que diziam que aquilo ali era uma revolta mesmo. Diziam que todos os dias as pessoas olhavam para eles- sobretudo elas, já que a maioria esmagadora são mulheres- como vassouras varrendo o chão, invisíveis e automáticas. Um trabalhador da USP levantou e disse, então, com aquela veia do pescoço estalada como se estivesse falando e cuspindo fogo ao mesmo tempo, parecendo muito revoltado mesmo: “ Vocês são vistos como objetos que devem ser usados e jogados fora! Todo dia as pessoas olham pra vocês e ignoram o que vocês fazem. É hora de serem sujeitos e deixarem de ser objetos!”. Em seguida, como que pulando do chão pra não perder o tempo e a deixa, um estudante gritou bem alto: “Hoje as vassouras mostraram que tem vida! Não serão mais objetos e nem usados do jeito que estes canalhas as usaram até hoje! Hoje é o dia de começar a insurreição das vassouras!”
Aquilo fez explodir um mar de palmas, berros e sorrisos.
Em seguida um estudante continuou dizendo que a luta daquelas mulheres e homens era histórica, lembrando de um tal de maio de 68 e falando de uma tal aliança operária-estudantil que historicamente derrubou muitos daqueles patrões safados e foi capaz de garantir que num lugar lá longe todos pudessem ter uma vida diferente, com emprego, saúde, lazer, educação e moradia pra todos.

Toda a falação animou a companheira que, terminada a atividade, foi conversar com suas amigas sorridentes e tomar mais suco do galão de água improvisado.
Encontrou de novo o estudante, que foi falar com ela sobre o que ela tinha achado. Ela respondeu que achou muito bonito tudo aquilo que foi dito e que estava muito feliz por estar ali com os estudantes, que nem o tal do maio de 68. O estudante então, como que lembrando daquilo que ela disse anteriormente falou:
-Você lembra que me disse que a luta é difícil?
Então ela respondeu:
- Sim sim. Ela é, mas estamos juntos e que nem disseram ali, vamos vencer juntos!
Com um sorriso no olhar o estudante então disse:
Isso mesmo, não vamos dar nenhum passo atrás. Lá na frança, em 68, os estudantes e trabalhadores fizeram umas frases que marcaram a história. Uma delas era “La lutte continue”.
Confusa, a trabalhadora indagou:- Mas o que quer dizer?
-A luta continua! Ele respondeu.

Eles se olharam, sorriram e deram um longo abraço seguido de mais falação, debaixo do sol e sob a grama.
Algo, naquele dia, fez o estudante e a trabalhadora pensarem e os fez- e tem feito- seguir a risca o sentido desta última frase, histórica e carregada do sangue e suor de muitos trabalhadores e estudantes, unidos em luta. Para aqueles, no passado, e estes, no presente, a luta continua!



domingo, 14 de agosto de 2011

O “campo de batalha” cotidiano do trabalhador


O “campo de batalha” cotidiano do trabalhador
São 4:30 da amanhã. O tilintar do rádio-relógio ressoa como um martelo batendo em aço, em sua cabeça. João levanta de um só pulo e em dois movimentos se desfaz de seu calção e sua camiseta.

Daqui até sua saída serão exatamente 15 minutos, contando o banho, os ágeis movimentos para vestir suas roupas, o ajeitar final da mala aonde guarda sua vestimenta de trabalho, o embrulhar da marmita, a abocanhada no pão com margarina feito na noite anterior, o vestir da bota grossa e o beijo em sua esposa.

É recém casado com Maria. Ajeita a comida que vai na marmita da esposa- que se levanta em 10 minutos- e a deixa em cima da mesa de madeira compensada com os “pés” de metal; sai de casa e se vai para o ponto de ônibus.

João desce sua rua, ainda no escuro, vendo a fumaça sair de sua boca, enquanto pensa que precisa dar um jeito de arrumar algo melhor para sua esposa ou pedir um aumento. Limpar só tem dado dores a ela e a Empresa inclusive ameaçou de sumir e não pagar os salários e os direitos. Já tinha ouvido da boca da Josefa, amiga da Maria, que coisa parecida tinha acontecido lá na Usp, com uma tal de Dima e União, mas não imaginava que num lugar como a USP algo assim pudesse acontecer... Afinal, não era lá a escola dos “patrão”?

Sua especulação é abruptamente interrompida pela chegada no ponto de ônibus. Lá encontra o Martinho, vigia do terminal de ônibus e o Felipe, que acabou de entrar no telemarketing de dia e na Faculdade paga a noite. Junto deles, mais umas 10 pessoas do Bairro que só conhece de vista. João os cumprimenta e se prepara para o primeiro desafio: Pegar o microônibus.

Como calculado, o microônibus passa por volta das 4:55. Todos precisam subir já que a “ máquina de ponto” não entende muito bem de atrasos e problemas. A primeira batalha do dia começa:
Todos sacam os bilhetes de passe e se amontoam estratégicamente para ocupar o melhor espaço no microônibus, já abarrotado de gente. Mesmo se conhecendo, a hostilidade não deixa de ser evidente. É um resmungo pra cá, um empurrão mais forte pra lá, uma olhada de soslaio como quem diz “aí também não, né?” e, neste primeiro campo de batalha, todos disputam durante toda a viagem de 15 minutos até o Metrô, uns milímetros a mais no metro quadrado que abraça incríveis oito pessoas.
A viagem é tensa, barulhenta e muito quente. João olha pelos poucos espaços entre os corpos buscando observar as expressões. São uma combinação de sofrimento, raiva e passividade. Olhares caídos, distantes e expressões pálidas são o lugar comum...

O microônonibus chega ao metrô e a batalha recomeça. Muito empurra-empurra e a saída está completa. Pela rua e pelas calçadas, fileiras e fileiras mal-organizadas de pessoas marcham para a entrada do Metrô. Tim-tam, Tim-tam, Tim-tam, é o som do bater de sapatos apressados que prendem a atenção de João, não menos ansioso para entrar na estação e pegar o trem.
São 5:15 e ele entra às 6:15. Tem de bater o ponto até as 6:15 sem adiamentos.
João, apesar de toda esta pressão, aproveita ao máximo esta caminhada de cerca de 2 minutos, 200 passos e um pular de escadas, como um respiro de “paz” que precede o que virá. Pega o jornal gratuito que distribuem na porta da estação, coloca debaixo do braço e se encaminha para o segundo campo de batalha a enfrentar.
A subida das escadas é um desafio menor perto do que tem de enfrentar.
De cara, se choca com a multidão de gente apressada e pressionada, que tenta passar o bloqueio das catracas. Bate cartão, soa apito, bate cartão, soa apito, bate cartão, soa apito. Esta é a dinâmica da catraca.
Chega sua vez e, como não poderia deixar de ser, não é diferente.

Começa a corrida contra o tempo e o espaço. Multidões de apressados descem a escada e se encaminham para a estação. Posicionam-se estratégicamente- como no caso do Microônibus- em frente a sinalização das portas dos Trens e se aglomeram em verdadeiros bolos humanos, que vez ou outra soltam bolhas de fermento graças ao desconforto e aos choques. O trem chega, já com os lugares todos ocupados pelos passageiros da penúltima estação, pára e se posiciona. Os ânimos se acirram. Parece que ninguém gostou que “seus lugares” fossem tomados pelos passageiros da estação anterior. A aglomeração começa a vibrar. O apito toca. As portas abrem e o turbilhão é incontrolável.

João, no meio de um destes bolos, segue, como todos os dias, o ritmo da cidade. Empurra firmemente e se apóia aonde dá até encostar o rosto na frente da porta, do outro lado do trem. A massa de gente continua se convulsionando como que buscando encontrar uma forma aceitável e consensual para todos. O apito toca e, novamente, começam os insultos, o burburinho, os olhares e as reclamações. Passa a primeira estação e o clima já se estagna e retorna aos passivos, distantes e desconsolados olhares de tantos trabalhadores... Este é um processo dinâmico que, a cada viagem e a cada trem, tem suas particularidades e demonstram seus traços comuns.

João se acalma, apesar de vez ou outra- e não só ele- provocar um empurrão aqui, um olhar mal-encarado ali, tudo para buscar manter “seu espaço” e sua viagem. Intimamente ele- e, muito provavelmente, todos por ali- pensam: “Nem a merda do sossego na viagem pro trabalho eu tenho?”.
No caminho de quase uma hora para o trabalho, João sempre olha as mesmas paisagens, com os mesmos telhados e as mesmas cores, da mesma janela e na mesma linha, todos os dias. Só o que muda são os odores, os empurrões e o trem.
Entretanto, quando consegue pegar, sempre gosta de ler o Jornal Gratuito distribuído em frente a estação. De fato, é um jornal publicitário com 90 % de propaganda e 10% de notícias, ainda assim, para João, ter aquele material de manhã e poder distrair-se é sempre muito bom.

Abre cada página com cuidado examinativo rigoroso. Lê cada anúncio de imóveis, notícia dos astros do futebol e todo aquele papo de partidos, coligações e não sei quantos milhões que foram transferidos, retirados ou investidos aqui e acolá, com muita atenção. Nesta edição, algo na primeira página lhe chama a atenção.
O título da capa diz
“LONDRES EM CHAMAS; GRÉCIA RESISTE; CHILE NAS RUAS: INVESTIDORES E EMPRESÁRIOS APREENSIVOS COM AS MOBILIZAÇÕES POPULARES.”.
João nunca tinha visto o que estava naquelas imagens. Fora o ônibus que queimaram quando a polícia matou o Diego - menino trabalhador lá do bairro, pego a noite e pelas costas-, ele nunca tinha visto tanto carro, casa, pneu e viaturas apedrejados e queimados e nunca tinha visto tanta gente na rua. Lê tudo o que falam sobre os baderneiros e sobre o assassinato de um “homem suspeito de um bairro de periferia” no jornal e não tem como não lembrar do Dieguinho e da revolta e indignação que aquilo gerou. Na ocasião, mais 4 ditos “baderneiros” foram levados pelo choque e liberados, mais moídos que arroz de 3ª, três dias depois.

João, então, fica pensando nos motivos daqueles jovens em Londres e, quando vê o que ocorre na Grécia e no Chile, não deixa de expressar, de um lado uma simpatia ardente e por outro um alívio enorme por ter seu emprego nestes tempos duros. Já tinha ouvido seu irmão e amigos dizerem o quanto está difícil arrumar um emprego depois que perderam os últimos e isso, de fato, o assustava...

Mais uma vez seu pensamento é interrompido pelo imperioso ritmo da máquina citadina. João tem de descer e encarar seu terceiro campo de batalha: a transferência para a linha ferroviária.
Começa de novo a mesma dinâmica. Empurra-empurra, olha-olha, berra-berra, reclama-reclama, para-para, entra-entra, sai-sai, acomoda-acomoda, acalma-acalma e, enfim, João está de novo num outro bolo Humano a caminho de Capuava aonde vai entrar daqui a 20 minutos na fábrica aonde trabalha.

A esta altura, João, frente à iminente jornada de trabalho- que na verdade já começou bem antes do “previsto legalmente”- se rende aos apelos de Morfeus e adormece, ali mesmo, de pé, pendurado com um pingente na barra do trem. Não sonha. Inclusive, para ele, já faz algum tempo em que não pensa em seus sonhos ou se é que ainda existem. Sejam os pensados ou os “sonhados”.

O apito toca e o som anuncia: “Próxima estação: Capuava”. João, acompanhado de um batalhão de outros trabalhadores, se aglomeram e praticamente ignoram a presença da porta a sua frente, saindo impetuosamente, tendo-o em sua linha de frente. Ele corre para a saída da estação, passa a catraca e atravessa a rua correndo.
São 6:10 e ele chega na máquina de ponto em 3 minutos, correndo.
Seus movimentos são desengonçados e meio tortos, afinal, não é mole carregar uma Bolsa cheia de roupas, com sua marmita e correr com aquelas botas do serviço.

Quando está próximo de chegar à entrada da fábrica, já acenando ofegante ao vigia da entrada, ouve a sirene e os gritos: “Vai, vai, safado. A casa caiu, a casa caiu. Vai pra pare...” Antes de ouvir o fim da palavra já está com uma mão na cabeça, outra empurrando as costas e o rosto pressionado numa parede. Segue o procedimento:

-Qual seu nome?
João Roberto da Silva.
-Tem passagem, neguinho?
Não, senhor.
- Usa drogas, malandro?
Não senhor, eu sou trabalhador e to atra...
- Cala a boca, porra. Responde só o que eu perguntar. Dá os documentos.
Tá aqui, senhor.

O “oficial” da lei, examina João e seus documentos, liga para a central, faz mais algumas perguntas e libera o trabalhador com um “fica esperto, falador.” e um sorriso para seus “companheiros de profissão”. Todo este processo durou exatos 25 minutos, na frente dos colegas de trabalho de João, que até queriam ajudá-lo, mas o chamado do Ponto falava mais alto.
João entendia e sabia muito bem que era ruim se meter com a Polícia. Já tinha sido “enquadrado” muitas vezes antes.

João então, nem pensando em nada, apenas com a imagem da máquina de ponto e do patrão na mente, corre apressado para a entrada, cruza o portão principal e o estacionamento da fábrica em tempo recorde e chega à maquina de ponto. Lá, retira seu cartão e vai passar, quando percebe que a realidade não seria tão generosa assim.

“Seu Roberto”, como costumam chamar os aduladores e puxa-sacos, ou “velho desgraçado”, como o chamam os operários, aparece de sua porta e, munido de sua autoridade de patrão e um olhar repressor diz tudo o que João não queria ouvir:

-Você vai ter o dia descontado hoje, viu?
Mas Seu Roberto, eu estava no horário até que a polícia me parou ali na entrada e nem falaram o motivo.
-Não me interessa...Como é seu nome mesmo?
João, senhor.
-Não me interessa, João. Se eu deixo você se atrasar assim, que exemplo vou dar para os outros trabalhadores daqui, ein? Tem gente que vem de mais longe, chega no horário e não fica arrumando encrenca com a Polícia antes do trabalho.
Mas eu já te disse que não foi culpa minha. Eles que me pararam.
- Hoje seu dia vai ser descontado. Pode descontar desse aí, Nelson!
Então eu vou embora e volto amanhã, senhor.
- Prefere ir embora e não voltar nunca mais, “João”?- disse o patrão com um tom misto de nojo e sarcasmo.
Não senhor. Tô indo lá pras máquinas...

João não sabia, mas nestes últimos 30 minutos, havia passado por dois campos de batalha dos quais, necessariamente, ele seria derrotado.

A polícia e o Patrão e as situações que os envolvem, para o trabalhador, constituem uma das batalhas mais árduas e, certamente, João, ali, naquelas condições, sozinho, não estava preparado para combater e/ou para vencer nem, a exemplo do metrô, “alguns milímetros” de espaço.

São 6:40. A esteira começa já a rodar. O dia começa a raiar. Para nosso trabalhador, o dia acaba de começar. João é consumido, nas primeiras horas do dia, por um ódio enorme.
As pragas que profere em sua mente se mesclam com as imagens que viu no Jornal de manhã. Subitamente sente a vontade de explodir toda a fábrica e de enforcar seu patrão. Desconta toda a raiva na produção: Bate, amassa, entorta, retorce, encaixa, ajeita, prende, puxa, prende, passa...Milhares e milhares de vezes. Pouco a pouco, esta elasticidade dos sentimentos e pensamentos passa e João volta ao “normal”...

O dia é longo e, por fim, 6:40 se tornam 15:40, músculos fatigados, muita fome e muito sono. A jornada de 9 horas se passou e João se prepara para enfrentar novamente as mesmas batalhas, nesta volta para casa. Veste sua camisa reserva e se encaminha para a estação.

Ao sair da fábrica tagarelando com alguns companheiros de seção, João e eles olham para a rua que precisam atravessar e veêm muitos paus, pedras e, em frente a estação, um bolo de gente, como aqueles do trem e metro, desta vez não se empurrando e praguejando, mas se segurando, protegendo e jogando pedras e paus nos guardas da ferrovia e nas poucas viaturas que tentavam desobstruir a Rua, fechada por pneus e até um carro virado, em chamas.

João e seus companheiros, aflitos, seguram o primeiro daqueles “loucos” e pergunta o que se passa. Ele lhes diz que aquilo começou por que o Zé Pinéu, limpador da centrífuga, que já tinha avisado a chefia, por mais de 10 vezes, que o banquinho estava frouxo e que precisa trocar, caiu na boca da centrífuga e perdeu a perna direita. Se não fossem os operários, ele teria caído com o braço na engrenagem e poderia ter sido “moído inteirinho”. Os chefes demoraram uns 30 minutos para chamar a âmbulância, enquanto o Zé Pinéu morria nos braços de um dos operários. Dali,, indignados, os trabalhadores trancaram o patrão na fábrica e foram correndo para as fábricas vizinhas e para o metrô chamar aqueles que já estavam indo embora. Foi quando começou o furdunço da Guarda do trem e dos poucos policiais que começaram a ameaçar os trabalhadores caso não “dispersassem”...
O homem, dá um tapa nas costas de João, pega uma pedra no chão e vai para a estação.
João e seus companheiros olhando aquele mar de gente e pensando nos tantos Zé pinéu's que devem haver em sua fábrica, lembrando do que a Polícia lhe fez passar em toda sua vida e do seu patrão, hesitaram alguns instantes mas depois de alguns segundos, entreolhando-se e chegando a uma resposta quase instintiva, entram no meio da confusão, pegam paus e pedras e vão para cima da Polícia.

A imagem de londres e das bombas parecem, agora, cada vez mais vivas para João.
Em sua mente ressoa o pensamento: “Olha só, como aqueles filho de uma égua do jornal tão falando merda. A mulequada e os trabalhadores só tomam na cabeça aqui e no mundo. É todo dia Humilhação e cacetada. Agora vamo fazer que nem eles, tudo junto.”

O conflito dura 4 horas e é noticiado nos jornais e telejornais de todos os principais meios de mídia.
A “Rebelião dos indignados Fabris” é fruto de debates acalorados entre militantes de esquerda e senhores engravatados, juristas e parlamentares.

Na região, agora após 3 meses, não entram mais jornalistas sem pedradas, os patrões não seguram mais os trabalhadores, seus ritmos e sua organização e nem os “velhacos” do sindicato entram lá sem tomar um “pau”.

A peãozada, conversando com uma molecada que estuda lá no trabalho da Maria decidiu retomar o sindicato na próxima eleição e fazer algumas assembléias de todas as fábricas da região, juntas. Já participaram de umas manifestações lá em Capuava e no centro de São Paulo e estão fazendo muitas reuniões com outros trabalhadores, até mesmo daquele maldito e lotado Metrô.
Ouviram muito falar sobre classe, partido, burgueses e dos “pelegos” e patronal.
Os donos das fábricas mais de uma vez chamaram o “choque” para impedir as paralisações em solidariedade às outras categorias em greve e, agora, o governo quer até acabar com as “comissões internas” nas fábricas e impedir o “Movimento 'Zé Pinéu'” de levante anti-burocrático e de organização dos trabalhadores, como tem dito a Mídia burguesa, cruel e sarcásticamente.

João, após aquele dia, ao chegar em casa estrupiado e empolgado, jamais imaginava que aquele processo se daria e muito menos que ele seria eleito um dos representantas dos trabalhadores da Comissão de sua fábrica em pouco tempo.

Na ocasião, depois de contar tudo à sua mulher, soube que esta não teve tempo de fazer sua comida e passar sua roupa. Ficou bravo, discutiu e foi deitar, irritado. Não parecia certo que a “SUA mulher” não tivesse feito os seus deveres.

Ali, naquele momento, João não percebia que impunha, na verdade, à sua companheira, mais um campo de batalha: O da dupla, tripla e quadrúpla jornada de trabalho, uma dinâmica que acomete a todas as proletárias do mundo. O destino de serem as “trabalhadoras do trabalhador”.

Mais tarde, João, recebeu- e aceitou vivamente- severas críticas de Maria, recém eleita membro da comissão representante das trabalhadoras terceirizadas da Tolima e que, a partir de então, iria se encontrar nas assembléias conjuntas das categorias, com João, em São Paulo.

Desde então, João lembra daquele dia no trem e das imagens de Londres e Grécia que, no mundo, só se reproduziram e intensificaram.

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Uma homenagem às trabalhadoras e trabalhadores que enfrentam seus “campos de batalha” todos os dias e ao Futuro que, certamente, Nos pertence!

Valeu Suzano, pela inspiração e pelo Rap.

terça-feira, 19 de julho de 2011

O "Pink Money", os estereótipos e a apropriação de "guetos" pelo Capital.



Apesar de há algum tempo já existente, poucos são aqueles familiarizados com um termo que, por dentro de todo o debate gerado pelo brutal aumento dos ataques contra homossexuais tanto nas ruas das principais capitais brasileiras quanto no Congresso por Bolsonaro's e evangélicos, adquire centralidade e merece uma atenção especial daqueles que buscam entender como o capitalismo pretende a "resolução" de algumas das principais expressões de sua crueldade enquanto sistema econômico e social. Tal termo é o "Pink Money".

Criado já há algum tempo, o termo, como se define na Wikipedia, faz referência ao "poder de compra" da comunidade LGBT. Suas origens, alcance e perspectivas podem ser sintetizados da seguinte forma: "Com a ascensão do movimento dos direitos gays, o pink money passou de uma franja de mercado e marginalizado para uma próspera indústria em muitas partes do mundo ocidental, como os Estados Unidos e Reino Unido."¹ 
Esta dinâmica de transformação, da qual já emana um profundo conteúdo ideológico e desnuda inicialmente a maneira pela qual os capitalistas buscam lidar e entender a comunidade GLBT, encontra em numerosos artigos na internet e blogs aprofundamento e desenvolvimento.
Na maioria destes pontuam-se as bilionárias cifras que envolvem o "consumo gay" e buscam, por incontáveis vias, alertar e pontuar a importância de entender o "mercado" para, assim, e não há nada mais ideológico do que isto, "tirar melhor proveito" dele.

O que (dizem ser) é o "consumo gay" e a utilidade dos Estereótipos

Basta uma busca rápida e uma olhada nos estúpidos programas do dito "humor" para entendermos quais são as predileções dos homossexuais e/ou quais as áreas de interesses destes segundo a ideologia burguesa. Segundo um site dado a refletir o impacto, benefícios e a necessidade do empresariado e marketeiros dispenderem atenções ao "consumo gay", as principais áreas de interesse da comunidade são a automobilística, tecnologia, turismo, moda e luxo.²  
Obviamente que toda a estética e referências envolvidas são recheadas de todo o tipo de estereótipos e chavões pejorativos os quais, historicamente, foram atribuídos aos gays.
O Sadomasoquista, o bombeiro, o "emplumado", o delicado, o espalhafatoso, todos são os "tipos ideias", dos quais, nenhum homossexual, bissexual ou transsexual pode escapar. 

Tal é e sempre foi a tendência de interpretação das minorias e dos grupos indesejáveis, por parte da ideologia dominante, que seja, estereotipá-los, transformando-os em elementos caricatos e identificáveis, passíveis de separação e segregação para, assim, "Guetorizá-los" e proteger o padrão de indivíduo, desejável, estável, heterossexual, casado, branco e que deve se constituir, necessariamente, como a regra da sociedade como um todo.
Este processo, todavia, não é novo, nem na história dos oprimidos, nem no caso da comunidade LGBT. 
Basta ligar a TV em qualquer canal propagador do sensacionalismo e evidenciador da barbárie cotidiana da sociedade de necessidade capitalista, para vermos quais são os estereótipos atribuídos aos Jovens negros, pobres e da periferia, enquanto ladrões, estupradores e bandidos; às mulheres, enquanto, em sua grande maioria, donas de casa, "esposas", submissas e resignadas e, se forem negras, enquanto domésticas e faxineiras (Não por retratem a triste realidade da maioria da População feminina deste país submetida aos piores e mais degradantes empregos, mas por reproduzirem-nas enquanto corretas, sem críticas); dos homossexuais como os, chamados socialmente, "tarados", escandalosos e descontrolados e segue-se uma longa linha de definições rígidas e absurdas...

Como dissemos, no entanto, tal processo serve como uma espécie de "definidor universal" e bloqueio da ideologia dominante, definindo o "distinto" e o "regular", o diferente e o normal, para garantir a manutenção de seu padrão desejável e colocar em seus devidos guetos o que "surge e é diferente" sendo que, invariavelmente, como em tudo no capital, tal processo terá suas implicações econômicas, que encontram uma expressão acabada em relação a comunidade GLBT no "Pink Money".

 Pink Money: Aspectos positivos para a comunidade GLBT em sua "integração"?

A transformação da comunidade Glbt em "mercado gay", necessariamente precisaria passar por um processo de "homogeneização" de interesses pela via da conformação de tipos ideias, estereótipos, que, como demonstramos, servem a um interesse essencialmente ideológico de separação daqueles agrupamentos de indivíduos de um todo, cujas características são tidas como ideais e desejáveis. 
Esta definição possui base histórica e, sendo assim, basta voltarmos 40 anos no tempo para observarmos o quão indesejáveis e segregados eram os homossexuais na Grande Nação da liberdade, os EUA, na qual, os ataques aos homossexuais nas ruas, praças e pontos de encontros, dentre eles o emblemático STONEWALL, ao qual iremos nos referir mais a frente,  pelos orgãos repressivos do Estado -Polícia- eram tão comuns, ou mais, quanto os espancamentos, prisões arbitrárias e assassinatos de jovens "afro-americanos", submetidos a um apartheid aberto, que começavam a se organizar nos Grupos que dariam origem aos “Panteras Negras”.

Esta transformação das ditas "diferenças" em "mercados" é uma das principais ferramentas de objetificação de agrupamentos de indivíduos com características distintas do padrão aceitável burguês e, igualmente, uma importante ferramenta de cooptação e "fagocitose" destes setores, outrora oprimidos e atacados. Vende-se, então, a ideia de que, para garantir-lhes espaço na sociedade, é necessário atender-lhes aos seus interesses, cujas fontes de referência são os numerosos estereótipos pré-estabelecidos, realizando, assim, um duplo objetivo aos capitalistas: A transformação dos setores oprimidos e marginalizados em números objetivos e fonte de consumo para determinados ramos da produção e a cooptação destes setores e "amortecimento" dos conflitos sociais, estes gerados pela própria ideologia capitalista que, naturalmente, por dentro de uma sociedade de opressão e exploração, não deixarão de existir. 

O resultado é o esperado e constatado em relação a muitas comunidades historicamente oprimidas, ou seja, seu isolamento em guetos constantemente discriminados e atacados, elemento extremamente desejável pelos capítalistas pois divide a calsse trabalhadora dentro dela própria, com heterossexuais discriminando homossexuais, etc; a cooptação de milhões destes oprimidos ao projeto de sua realização no consumismo e na obtenção dos bens e posições ideologicamente vendidos e, em momentos de agudização das tensões sociais; a retomada de uma escalada de violência e ataques àqueles que representam o "indesejável" e não mais podem ser "toleráveis"- existe termo mais ideologicamente reacionário e cínico do que este?- na sociedade.

Recentemente, vimos reportagens que nos colocam os números da barbárie cotidiana relegada aos GLBT's e que nos evidenciavam espancamentos cotidianos de jovens que moram nos morros dos Rio de janeiro. Da mesma forma, centenas de mortes continuam ocorrendo todos os anos e o número de espancamentos, só na região da avenida Paulista se mantém em níveis estratosféricos. No mesmo sentido, a bancada evangélica organiza milhares de pessoas em marchas contra os direitos GLBT's e propagam, ao lado dos adeptos- assumidos- da ideologia da ditadura militar e da extrema direita, o ódio e a morte aos gays, lésbicas e todos os de orientação não heterossexual, pelo bem da Família, da Ordem e da Propriedade Privada. Neste cenário, até mesmo os grandes avanços, como a recém aprovada União estável, perdem completamente seu brilho, frente à reacionária PROIBIÇÃO de homossexuais doarem sangue e o veto Homofóbico, perpetrado por Dilma, ao Kit-Anti-homofobia. Nos termos mais populares e simples possíveis, fica a pergunta: "De que merda de integração dos GLBT os marketeiros e cães do capitalismo de plantão estão falando?"

De volta a Stonewall (Por isso lutamos) e a liberdade de SER

A revolta de Stonewall, como ficou conhecida, foi um processo de resistência e confrontos ocorrido em Nova York, em 1969, como resposta aos corriqueiros ataques, prisões, espancamentos e prisões arbitrárias que ocorriam na região da cidade conhecida como Greenwich Village. Após o que seria "mais uma batida cotidiana policial" os moradores homossexuais, travestis e moradores de rua que residiam na região e se encontravam no Bar Stonewall, decidiram se levantar e reagiram, desta vez nos mesmos termos, aquele ataque cotidiano. Prenderam os policiais e provocadores dentro do Bar na primeira noite, enfrentaram-se com as tropas de choque detrás de barricadas por semanas lado a lado de artistas, jovens, trabalhadores e militantes negros que já haviam combatido a polícia nas manifestações anti-guerra e, sendo assim, deram passos decisivos na autodeterminação de seus destinos, aglutinando milhares ao seu lado.

O processo de Stonewall, no qual se desenvolveu uma auto-organização interessantíssima contra a repressão e sua segregação, foi o berço de formação de organizações de luta pelos direitos do que chamamos hoje de GLBT, organizações estas que passaram a retratar as mazelas e a opressão cotidiana e a, até mesmo, organizar ações de enfrentamento tático contra a repressão que ainda perdurava em nome do Esquadrão de Moral Pública da época, que, em numerosos Países tem numerosos nomes com o mesmo intuito, proibir, reprimir e, quando possível assassinar. Este exemplo, não poderia deixar de ser lembrado e, dele, não podemos deixar de buscar lições.

Obviamente que não propagamos aqui a condenação em relação a qualquer aspecto dos "estereótipos ideais" que criticamos. Os exaltamos para evidenciar o quão simplista e formatador é o movimento da ideologia burguesa a serviço dos interesses do capitalismo que transforma o indivíduo, cujas potencialidades são enormes e tendem ao infinito, em elementos formatados, rígidos, secos, limitados e reprimidos em todos os níveis, sobretudo pelos padrões machistas, homofóbicos e racistas que fundamentam esta ideologia.

Os lutadores de Stonewal diziam :  
"times were a-changin'. Tuesday night was the last night for bullshit.... Predominantly, the theme (w)as, "this shit has got to stop!"Participante anonimo. Ou seja, esta merda tem de parar. Em inglês, inspirador. 
A opressão e "guetorização" dos GLBTT's tem de terminar e, mesmo com o brilhante e inspirador exemplo de Stonewall, sabemos que ainda demos pouquíssimos passos no sentido de avançar para sua "liberação", sobretudo, porque sabemos que estas tarefas envolvem, como buscamos demonstrar, um questionamento mais profundo da sociedade de classes na qual estamos.

Apenas questionando os estereótipos, os "dever-ser", a dinâmica de apropriação de um lado e de segregação de outro estabelecida pelo capitalismo em relação aos "indesejáveis"; somente buscando construir uma sociedade que se livre de todo o culto à aparência e busque a essência; somente construindo escrupulosamente uma sociedade cuja produção esteja a serviço das necessidades da maioria da população e não do lucro de uma fração ultra-minoritária da sociedade, os capitalistas; somente construindo, hoje, no pequeno, polegada por polegada, uma Contra-moral, uma legítima moral revolucionária, que se paute pela Liberdade Sexual completa; somente construindo uma sociedade que se paute por uma moral que não se pauta na auto-repressão, no auto-flagelo, na discriminação, na segregação, mas sim na completa autodeterminação pensada e organizada coletivamente; somente assim, refletindo e construindo tudo isto e muito mais, é que avançaremos na perspectiva da superação de nossa opressão, seja qual for.

O capitalismo merece e PRECISA perecer


 O capitalismo é um sistema econômico e social Podre e decrépito, baseado na exploração, na mentira e na transformação das massas em objetos de uma ínfima minoria. A ideologia Burguesa teve muito esforço em caracterizar a doutrina marxista, no que diz respeito ao que prega acerca do desenvolvimento do individuo e acerca das questões cotidianas e "morais", como um sistema de idéias que pregava o Rígido, estreito e o castrador. Não é difícil lembrar da propaganda anti-comunista que colocava lado a lado milhares, com fardas verdes, pastas de dentes iguais, vivendo em ocas gigantes e completamente alienados.


Na realidade, é nesta inverdade que se evidencia o principal medo e este é o recurso ideológico mais desesperado e de apelo ao velho que a burguesia internacional lança mão. Hoje, milhões passam fome enquanto bilhões de alimentos são queimados todos os dias. Igualmente, bilhões estão relegados ao desemprego e observam a face cruel de suas mortes sem perspectiva. Milhares e milhares de recursos, terras e bens nas mãos de pouquíssimos capitalistas e bilhões de desalojados, desabrigados, desprovidos de terra, moradores de Rua, etc. As idéias, os costumes, os valores, o aceitável é um padrão que se vende em lojas e homogeniza as intenções e os desejos- ou a repressão destes-...

Lutamos pela liberação desta lógica de opressão. Pelo fim desta sociedade e por uma cuja produção esteja a serviço de produzir e garantir, sejam remédios, alimentos, casas, transportes, etc e etc, a maioria da população conforme precisem. Somos pela transformação desta ideologia castradora e pela completa liberdade sexual, pela libertação da produção artística, pelo livre desenvolvimento da individualidade de cada um, dentro de uma sociedade dirigida CONSCIENTEMENTE e coletivamente.

Digam-nos: O que lhes soa mais castrador e arcaico? O que a sociedade capitalista tem a nos oferecer?

STONEWALL e o exemplo de seus lutadores, se organizando de modo independente e se aliando aos setores de jovens e trabalhadores negros, das periferias, contra os patrões e capitalistas castradores representados pela Polícia, nos indicam um caminho diferente do "PINK MONEY", da "integração burguesa" e de toda a opressão que nos reservam os espectros do velho.


AVANTE!

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Do Transe à Revolta.

Jovens e trabalhadores durante Mobilização na Grécia.

Este Blog é uma das muitas iniciativas tomadas por uma mente audaciosa.
As linhas abaixo podem parecer ter um sentido pretensioso, entretanto, esperamos que contribuam à reflexão necessária frente à catástrofe que nos ameaça devido à Crise econômica Mundial.
Vivemos em tempos de propagandeada calmaria, crescimento e desenvolvimento galopantes. Nos meios de comunicação, sobretudo nos grandes grupos midiáticos, nos é colocada a verdade absoluta do grande "boom" econômico brasileiro e o avanço Gradual e possível nas condições de vida de toda a população.
Famílias que viviam de migalhas agora tendo como comprar um saco de arroz; outras sem luz elétrica, agora com postes; ProUni, REuni, Univesp...
Estas são as ditas soluções para problemas antigos e recorrentes na vida dos brasileiros, principalmente daqueles que mais precisaram e precisam de efetivas soluções.

Em todos os lugares, desde o saguão das ciências sociais da Usp até o Congresso Nacional, passando por cada casa, bairro, local de trabalho, fábrica e fazenda, vigora a irrefutável assertiva de que este é o único caminho 
Possível; a única alternativa viável; melhor isto do que nada...

Apesar de todo este aparente avanço gradual e melhorias crescentes, cujo aumento é apontado de maneira profética pelos ideólogos do possibilismo, temos visto em todo o mundo uma onda de ataques e decorrentes convulsões, pelas quais, invariavelmente, o Brasil passará e já passa e as quais tendem a aumentar.

Sem terras sendo assassinados; Trabalhadores sendo demitidos em massa; o direito de greve atacado de maneira escancarada por meio da repressão policial e do corte de ponto; indígenas reprimidos pelos "orgãos mantenedores da ordem"; estudantes reprimidos por reivindicarem suas demandas básicas como o direito à permanência (moradia, alimentação) ; professores recebidos à bala no palácio do governo, numerosas manifestações da juventude tratadas do mesmo modo pela “democracia do gás lacrimogênio”... Todos estes são exemplos de como é falsa a impressão de calmaria, bem como é a de que as coisas tem melhorado gradualmente.

Sabemos que a crise econômica tem afetado enormemente uma série de países centrais, tendo seu epicentro atual na Europa. Nosso país não se encontra blindado às balas da crise e muito menos independente do destino das nações centrais do capitalismo.

O que tudo indica é que teremos, no próximo período, situações de ataque aos direitos sociais e trabalhistas tão grandes quanto os que hoje afligem a maior parte das populações destes países atingidos pela crise. Isso se dará, pois nos marcos da quebra de Bancos e empresas, os estados tem tido a política de salvamento às custas do orçamento público. O resultado  nós sabemos: endividamento público e a necessidade de conter o déficit orçamentário.
Obviamente já vemos como ocorre tal contenção. Educação, saúde, moradia, transporte, previdência, todos estes são alvos da ofensiva estatal e, certamente, a maior parte da população é que pagará com seus direitos a ganância destes poucos magnatas. Tal é o quadro, hoje pintado em telas gregas, espanholas e árabes e que terá como tela o Brasil.

Não diferentemente do que nos aguarda, é a situação da juventude, dos trabalhadores e das massas que se colocam em oposição a esta lógica. A resposta governamental é uma só: a repressão.
Para estes estudantes, jovens e trabalhadores, a única possibilidade real é dizer não. Para estes setores, a única saída realista, do ponto de vista de seus direitos e de seus anseios é dizer:
"Não! Se vão nos tirar, é agora que diremos que queremos mais; queremos tudo."

As mobilizações Francesas contra as reformas de austeridade que buscam se implementar em toda a Europa; os processos revolucionários abertos em numerosos países árabes, tendo o Egito, novamente, como a ponta de lança de um movimento de trabalhadores e da juventude combativo e “indignado”; os indignados da espanha, enfim, todos estes exemplos demonstram que o "possível" se define por uma questão concreta, ou seja, pelas condições objetivas de resposta e pela perspectiva e construção subjetiva para dar-se esta resposta.

Hoje, reiteramos, a resposta para as parcas condições de existência da maioria de nossa população, para a insuficiência da garantia de direitos elementares como saúde, moradia e educação, para a universidade elitista, para a falta de terras, para a miséria social generalizada, para a falta de universidades, enfim, para toda a decadência capitalista, é a idéia do avanço gradual, possível e seguro.

Nós, estudantes- sobretudo de Humanidades-, desde o início de nossa jornada acadêmica e, sobretudo, prática, buscamos refletir acerca dos marcos mais gerais da realidade humana que nos cerca. Acreditamos que o que nos impele é a busca do entendimento mais geral de como se organiza, mantém e para onde irá esta sociedade humana, com suas especificidades locais.
O questionamento, análise e observação de todos estes processos nos permitem questionar as respostas dadas e sua efetividade real.

Se quiséssemos entrar no mérito da questão demonstraríamos o quanto lucraram os grandes bancos e empresas, ou quanto há de concentração de terras nas mãos dos latifundiários ou quanto tem se destinado de orçamento público para as mãos dos grandes "líderes" parlamentares brasileiros, para, assim, demonstrarmos que não é verdade que o possível é apenas esta  miséria garantida. Não é, simplesmente, disso que se trata.

Buscamos, aqui, demonstrar o quanto estamos paralisados por toda a perspectiva gradualista, possibilista, que busca a confiança em fórmulas fáceis e ilusórias. Buscamos, desde nossas humildes reflexões, demonstrar o papel que a juventude deve ter no que diz respeito ao questionamento do status quo e a avaliação criteriosa e cientifica da realidade. Defendemos, não obstante, o engajamento prático desta juventude na transformação daquilo que deve ser mudado.
E sim, universidade precisa ser mudada! As idéias precisam ser reformuladas! A moral precisa ser questionada! A miséria precisa ser superada! O imobilismo precisa ser solapado!

No entanto, para isto, acreditamos na explosão crítica e contestadora deste transe social propagado e garantido massivamente ao nosso redor. Lutamos pelo incêndio das consciências na busca de soluções. Defendemos a superação das velhas direções apontadas pelos velhos grupos possibilistas.
Somos pela radicalidade intelectual! Acreditamos, assim, que a solução só se encontra quando buscamos a raiz das questões.

Como método, somos pelo incêndio da revolta. Que, como os estudantes franceses, árabes, espanhois e gregos, ao lado dos trabalhadores, tomando as ruas, possamos avaliar autonomamente e buscar as soluções para estas questões indicadas.
Não mais aceitaremos os limites do Muro do Possível. Não mais acreditaremos que a solução virá de bom grado como um presente. Não mais nos iludiremos com as promessas de um futuro melhor. Ao contrário, lançaremo-nos à frente de nossos futuros e construiremos, nós, a nossa saída. Tal saída será apenas a entrada de uma nova realidade. Nós, estudantes, aos lado de todos oprimidos que hoje repousam no gradualismo do transe, não permitiremos que digam aonde iremos;
IREMOS A TODO LUGAR!

A repressão se apresenta como via para a permissão dos ataques aos trabalhadores , estudantes, indígenas e outros setores que, diretamente vem sendo espoliados para que paguem a conta da crise, e este mesmo fator por vezes cala e imobiliza o protesto, deixando-nos em transe, juntamente com as medidas ilusórias como as falsas promessas de ascensão social..

É contra a força repressiva que nós, estudantes temos de nos mobilizar. Contra qualquer ilusão que vise nos colocar em transe diante dos constantes ataques, também temos de fazê-lo.
Tomando por exemplo a juventude européia e árabe e seus lutadores, precisamos romper com o corporativismo e nos apropriarmos, enquanto membros ativos e conscientes da sociedade, das lutas de todos os setores que em igual medida sejam atacados. Portanto, a resposta à repressão é a mobilização ao lado dos trabalhadores!

Transformemos o regozijo dos propagadores da passividade no combustível de nossa revolta.

É com este espírito que indicamos a abertura deste blog,
no qual convidamos todos a discutirem, dentre outras coisas, as questões concernentes à vida, arte e, sobretudo REVOLTA.

Que se abram novos tempos, construídos escrupulosamente através da destruição de tudo o que é velho e arcaico.
AVANTE!