sexta-feira, 8 de novembro de 2019

STF nega prisão em segunda instância: Liberdade... Mas pra quem?



É sempre um "anti-climax" tratar fria e objetivamente da política em momentos de euforia como este.

O jogo de velocidades entre as alas burguesas envolvendo a liberdade de Lula se acirrou hoje.

Em todas as manchetes há chamadas sobre quais as possibilidades dele, solto, se candidatar; senadores e deputados afirmando que pautarão, as pressas, a mudança da legislação sobre a possibilidade de prisão já em segunda instância; euforia na bolha "progressista" petista e semipetista; polvorosa na bolha bolsonarista e conservadora.

Lembremos: o STF, uma casta social de juízes vitalícios que não foram eleitos por ninguém, decidiu, por margem apertada de 6 a 5, que, segundo a constituição, para prender, só depois de todos os recursos a justiça.

Não deixaram, é claro, a porta fechada para que "o legislativo possa exercer seu direito de modificar a legislação", com o adendo do Jardineiro Paraguaio, Alexandre de Moraes, de que cabe ao juiz do caso analisar o caráter "cautelar" da prisão.

Piada pronta. Num país em que 41% dos presos são preventivos, ou seja, nem julgamento em primeira instância tiveram, alguém acredita que todos estes serão soltos?

Graças a "lei de drogas" de 2006, em que o PT, junto dos atuais desafetos e outrora aliados do centrão, MDB e até de Bolsonaro no PP, ajudou a transformar o Brasil no terceiro maior contingente carcerário do país, a política de drogas se transformou em política de CONTENÇÃO social e terror de Estado contra a população pobre e trabalhadora brasileira: a maioria negra.

Acreditar nessa decisão é o equivalente a acreditar que o aristocrático STF, presidido por Tóffoli, que num dia beija as mãos dos generais, legitima o impeachment e as reformas trabalhista e da previdência contra o povo e, no outro, diz, indignadíssimo, que "todos sabemos que quase metade dos presos no Brasil nem julgados foram", se tornou a principal arma contra a política das elites desde pelo menos a abolição!
Ou seja, que são as armas contra si mesmos!

Porque é isso meus amigos. A atual lei de drogas nada mais é do que a continuidade da lei da vadiagem: um pretexto usado para amedrontar e tirar de circulação todos os "elementos" negros e proletários que, após a abolição, não viram nem cheio de REFORMA AGRÁRIA, como nos, para tais juízes, invejáveis países civilizados europeus.
E sem terra pra plantar e moradia, como os negros iriam se abrigar e alimentar? Voltando a exploração dos mesmos senhores de escravos.

Uma política de gestão da miséria, da superexploração e da pobreza, vistas em quaisquer quebradas do país, através da repressão e violência

Eis aí a história dos últimos 130 anos, em que a superexploração do corpo do trabalhador e da trabalhadora negra, inclusive pelas mesmas famílias de senhores de escravos, são a continuidade da abolição mais tardia da história da humanidade, o que marca o Brasil até hoje.

É pensando nisso que, apesar da decisão do STF, alas inteiras do Senado e da Câmara aceleram seu carrinhos para tentar, antes da saída ou da anulação da condenação de Lula no caso do triplex (falam em iniciar as decisões na CCJ do senado na semana que vem), mudar a legislação para permitir esta prisão antes de todos os recursos.

Assim a ala lavajato-bolsonarismo, unida neste caso, mata dois coelhos: impede que seja enfraquecida com o "retorno do mártir" e mantém o projeto estratégico de eliminar qualquer contradição que os impeça de seguir o encarceramento ilegal, ilegítimo e imoral, dos negros no país, tentando convencer a elite em debandada de que "eles mostram serviço".

Por outro lado, há forças em movimento abaixo da superfície que a euforia não permite ver.

O conjunto do consórcio burguês em ação (comercial, latifundiário, rentista, banqueiro, industrial, gringo) fez o que fez desde 2014 para destruir o antigo pacto que significou a constituição de 88.

Dela só restam escombros. As relações de trabalho foram destruídas e substituídas pela precarização, terceirização e informalidade. A população mais pobre vai, estatisticamente, morrer contribuindo sem aposentadoria. A superexploração é base de taxas recordes de lucro para os bancos e para as grandes empresas industriais que ainda estão por aqui.
Por outro lado, o Brasil encara uma das maiores desindustrializações da história, vê toda uma camada de centenas de milhares de "empreendedores" falindo e voltando ao trabalho assalariado e assume sua vocação na nova divisão internacional do trabalho: o de ser uma semicolônia de exportações de produtos primários e só: ferro, petróleo, milho e soja. Nenhum país possui qualquer autonomia política desse modo.

Existem, no entanto, evidentes insatisfações com Bolsonaro e seu projeto de totalitarismo populista de direita e, se der, diretamente fascista, com sua declaração como "generalíssimo".
Ele nunca foi o filho pródigo. Esse se chamava Alckmin mas, apesar de dezenas de partidos e minutos na TV em seu apoio em 2018, não foi convidado nem para o banquete principal.

Bozo, então, teve de ser engolido, com seus métodos de gângster e suas tramóias corruptas, pelo menos até cumprir o máximo dos interesses do consórcio burguês.

Ocorre que esse tempo já passou após a aprovação das reformas e seu apoio popular, como demonstram as pesquisas, e nas elites, como demonstram os escândalos de Mariele e o fiasco da venda do Pré-sal, se corrói em praça pública.

A corrida de velocidades, distante do que as mentes ingênuas podem pensar - e não há erro maior do que a ingenuidade, na política -, que pode permitir a soltura de Lula  e o retorno de seus direitos eleitorais caso tenha sua condenação anulada no caso do triplex, também pelo STF, vai ser definida pelas movimentações de interesses da burguesia e da disputa entre as alas da burguêsia dos EUA.

Com Trump enfraquecido, os democratas e o "deep state" Yankee, junto de um setor da burguesia brasileira podem chegar a conclusão, como é o que indica, de que esse nível de polarização é imprevisível e perigoso no Brasil.

Lula pode ser escolhido como o artífice de uma nova etapa de conciliação de classes, vendida como "vitória popular", que vai lavar a cara do STF (que até aqui sambou na cara da constituição e apoiou de temer a Bolsonaro contra os direitos do povo), "dar um ar" para o regime político carcomido e, ainda assim, seguir trabalhando com os mesmos interesses das elites, principalmente a estadunidense.

A prova de fogo? Saindo, Lula vai lutar para revogar TODAS as reformas que destroem nossa vida ou para eleger os seus? Uma vez no poder, dirá que "não pode se revogar porque o senado e o congresso não querem"? Quer jogo melhor?

Lava as mãos, como a CUT e os sindicatos fizeram até agora, permite o retrocesso geral, diz que "é o que dá", retorna o toma lá da cá, o presidencialismo de coalizão com MDB e afins e, no final, negocia um lugar no novo regime que surgiu do golpe de 2016, em troca de pacificar, através da emoção e da lembrança, por alguns anos, a massa de miseráveis brasileiros.

Tudo sem tocar em nada do "PF" burguês, ou seja, os direitos trabalhistas ,empregos e a aposentadoria, arrancados pra obterem mais lucro e transferirem dinheiro pra pagar a dívida pública mentirosa com os bancos

Esse é o retrato não tão distante do Brasil e da abrangência do debate de hoje.

Assim, a liberdade virá pra quem? Nosso país, nosso povo mais pobre, nossas quebradas, nossa juventude, estarão livres?
Nem toda euforia se justifica...